Sobre o nadaUma garrafa de água, um copo grande de café.
Fica pensando no dia, as coisas para fazer, e tenta descobrir por onde começar.
Lembra de pessoas, frases, a cabeça dói e a internet saiu do ar de novo.
As mãos suam, e ela lembra do café. Ele esfriou, mas até que é bom assim.
Consegue tomar de uma vez, sem se preocupar em queimar a língua ou esquecer dele de novo, ali do lado.
As coisas instantâneas são um remédio para os ansiosos. Não tem um período, nem intervalos, só o imediato.
A internet não voltou.
Já está uma hora atrasada então resolve olhar para a mesa.
Mas ela não consegue terminar o texto.
Tinha como costume, escrito algo na noite anterior, e obviamente, pela manhã o que lê já não é o mesmo que pensa agora.
Talvez porque não deva ser declarado assim, o que passa em sua cabeça enquanto o sono não vem.
Sempre foi assim, desde criança.
Aqueles diários que declaravam uma distância do mundo, dos brinquedos, dos pais, da escola.
Eles ainda estão guardados, ali, em alguma gaveta.
Às vezes relê e se assusta em ser tão mutável e ao mesmo tempo continuar a mesma.
Ontem havia sonhado com alguém questionando os seus textos vazios e dispersivos.
Questionavam até quando teria versões do mesmo tema.
Ela dizia que enquanto a dor existisse, haveria o que escrever.
E , nos dias em que ela cessasse, falaria sobre as dores dos outros.
Porque a alegria não produz livros. Ela se esgota em si mesma, e não questiona o seu estado de espírito.
Por mais completa uma obra pareça existe sempre alguém do outro lado carregado de angustia.
E ela aprendeu que a angustia não é negativa.
A angustia incita a criar fôlego, a dizer algo, a mudar as coisas que não constroem.
Há sempre uma problemática dentro de cada um tentando achar a superação.
E a página em branco ainda não termina.
Tem dias que o que vê é só esse espaço.
Mil palavras se esgotam em sua alma e nada sai.
Há tanto o que se dizer, e milhares de possibilidades de frases, mas não se libertam.
A água esquentou e os dedos ainda estão no queixo, que mira para a tela do computador, inquieto, e inerte.
É essa a hora de uma mudança brusca de pensamentos para não se prender.
Não precisa mais de confusões, nem emoção, nem barulho, e tampouco cortes ou quedas.
Nem palavras talvez.
A página está chegando ao final e a morbidez volta a sua mente. Ficar sem falar por uma semana, duas semanas talvez, seria o ideal.
Não pronunciar uma palavra, não emitir um som... Ficar aqui dentro, pra tentar recuperar as palavras perdidas.
Mas o mundo lá fora grita, e assusta todas as conjunções, que se embaralham num esforço contínuo para dizer algo lógico e sem sentido...