Wednesday, March 24, 2010


Michê lê Maria.

Ele decidiu um dia mudar de casa,então teve que tirar as paredes esperadas e virou janelas.

Aberta, livre, para a brisa passar sem curvas.

De tanto espaço precisou ir para a rua. E lá fora às vezes é abafado.

Para sair do sufoco é preciso criar vento. Com as mãos.

E saia por ai, a trocar pés.

De tanto entortar as pernas longas sob um salto agulha branco, tornou seus passos tortos.

Andava por aí a gesticular, a tomar a rua com a sua voz rasgada.

Mas pensou muito antes de se dar esse nome.

E o sobrenome sempre foi para lhe proteger. Nome de santa, purificado, homenagem a sua mãe.

Mas ela nunca imaginou que isso a faria forçar a casta, virar puta.

Ficavam as duas por aí andando de mãos dadas, como uma possessão de espíritos bilateral.

E assim todas as vezes que abusava demais da noite que virava dia, entrava em uma igreja, ficava uns minutos sentada e ia embora, mesmo sob olhares assustadores das beatas. Mas isso nunca incomodou: nem putas, nem santas, pacatas.

Horas antes estava lá, a dançar entre os faróis dos carros, divina, e entorpecida, distribuia santinhos.

A maioria respeitou, e alguns até se converteram naquela mesma noite.

Ainda assim, fitaram os seus dedos cor prata de unhas grandes, passando pelas sandálias brancas, as pernas morenas, o volume que não mais existia entre a saia cotton preta, o piercing de brilhantes no umbigo, a blusa dourada, os ombros cavados, os fios pretos, o queixo bem delineado, a boca disforme, até olhar, e desviar.

Agora em sua casa sempre lotada , havia várias imagens do Expedito, seu favorito, ao lado de cinzeiros cheios, luzes vermelhas, tombos da escada de azulejo devidamente limpa com a cândida das noites iluminadas.

Thursday, March 18, 2010


William matou alguém

Mas diz que está limpo

E gosta de perfume

Quer um celular para o seu chip

Joga charme mesmo sem lugar para dormir

E precisa ligar para a esposa

Questiona a atenção que ganha em um amanhecer sem lar

Mas desce a rua como se soubesse.

Wednesday, March 10, 2010


Ao filho que eu não tive ou sobre a pílula do dia seguinte*


Como paredes incrustadas de vermes que corroíam um sentimento maciço a desenrolar pelos cabelos até o ventre

Desmistifica parâmetros sociais que querem apartar um momento de terribilidade

A doçura de seus olhos a não formar um foco ou seus dedos iniciais a tocar cada pedaço da pele saturada

Aquele que faria um começo de algo interminável e traria um torpor das lágrimas que sufocam e nunca saem

Sorrisos vazios, mas cheios de felicidade como os primeiros raios de sol a serem mostrados

Ou quando é levado por um carrinho nas ladeiras das mesmas ruas que passei um dia, sem imaginar o que seria fixo ao meu lado

Grunhidos de pura falta de comunicação a elucidar coisas a querer em sua trajetória incerta

Maleabilidade em teu corpo frágil que pretendia se confortar sempre em um amparo que o levaria a ver os ventos no fim da tarde

O enlaçar de suas dobras entre as minhas curvas antagônicas para te mostrar os pontos que nem sei

Aparecimento de uma identidade própria, a quem nada aprendeu, apenas ajudou a formar-se

O eternizado compactuante de palavras inexistentes para entender o que se explica com poucas ou nulas palavras

Ultrapassar os tempos para lançar-se em uma nova vida, aquela que não tinha consciência quando te mostrava ao mundo

Cheiros e cores de alegria que preencheriam qualquer significação contextual de música, literatura, arte ou determinado tom que escolhesse por conta própria

Amor eterno, sem duvidas ou incerteza mesmo que me odiasse ou temesse a própria entrada que insistia em mante-lo ali, preso

O risco dos convexos dissonantes que te mostraria um caminho com intenções de sua volta certeira

A aparente desconjuntura de nervos que estariam unidos e deformados na perfeição do que é retilíneo

Vai e volta para trazer ecos de alguém que já existiu por muitas vezes

Já viste a possibilidade de renascer, mas levantei e vesti minha roupa.

*do arquivo

Tuesday, March 02, 2010

Celebração


Débora passeava descalça, na rua da calçada de vidraças.
Virou-se e disse que fazia 34 anos. E seu aniversário.
Ofereceu-a cerveja , desde que pegasse um copo para si.
Sorriu e disse que estava com vergonha, entre as mesas.
Atravessou a porta de vidro , solicitou copo descartável.
Desprendeu-se entre os dedos sujos e marrons ao vento.
Seus dentes fixavam o voltar dos cabelos.
Olhou ao redor dos prédios avante.
Dividiu a sua bebida num dia de festa